Pronto, hoje foi dia de Chernobyl.
No ponto de encontro, fomos recebidos pelo guia turístico mais escroto do planeta: lacônico, mal-humorado, anatomicamente incapaz de dar um sorriso, com comentários de uma agressividade e condescendência tal que tenho dificuldade de lhe conceder o benefício da dúvida quanto a se tratar apenas de uma forma extremamente destilada de ironia, como um absinto do humor misantrópico. Condiz bem com a postura que temos encontrado na maior parte dos ucranianos, salvas heróicas e emocionantes excessões. Talvez por ter tido aquela recepção, todo o grupo da excursão passou a viagem também meio emburrado, interagindo pouco entre si, como se tivesse se afinado no tom errado.
Mas, de qualquer modo, lá fomos nós, uma dúzia de abutres, buscando turismo e diversão onde há um quarto de século tanta gente morreu ou sofreu tão dolorosamente. Disfarçando mal nosso demasiadamente humano impulso de ver o circo pegar fogo, ou de visitar o que restou do circo que já ardeu, sob algum discurso humanista qualquer de homenagem ou reconhecimento do heroísmo alheio. Ou melhor, sem douração de pílula nenhuma. Simplesmente fomos lá e pronto.
Conduzidos por um motorista monoglota e igualmente enfastiado da vida, só nos restou por boa parte do tempo escutar a musiquinha de FM ucraniana que este colocou para preencher o silência da comunicação indesejada e impossível. Música pop local muito ruim mesmo... Por sorte, o guia que nos acompanhou ao chegarmos na zona de exclusão não foi o primeiro, mas outro bem mais simpático e agradável. Várias paradas, subidas e descidas da van, nos vários lugares para tirar foto. Se misturássemos a dúzia de câmeras fotográficas e as redistribuíssemos a esmo depois, pouca diferença faria.
Ao final da visita, um almocinho na cantina local bem razoável, se a ideia era tentar reproduzir o que era um rango de alojamento soviético naquele tempo.
E então voltamos à van, para mais duas horas de viagem de volta a Kiev, quase todos dormindo, como hienas locupletadas de carniça existencial, secretamente felizes por terem sido os outros os envenenados por radiação, e não nós, intimamente pensando que radiação no cu dos outros é plutônio.
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